Um giro ao sol,ciranda poética

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Desejo

Desejo primeiro que você ame,
E que amando, também seja amado.
E que se não for, seja breve em esquecer.
E que esquecendo, não guarde mágoa.
Desejo, pois, que não seja assim,
Mas se for, saiba ser sem desesperar.

Desejo também que tenha amigos,
Que mesmo maus e inconseqüentes,
Sejam corajosos e fiéis,
E que pelo menos num deles
Você possa confiar sem duvidar.

E porque a vida é assim,
Desejo ainda que você tenha inimigos.
Nem muitos, nem poucos,
Mas na medida exata para que, algumas vezes,
Você se interpele a respeito
De suas próprias certezas.
E que entre eles, haja pelo menos um que seja justo,
Para que você não se sinta demasiado seguro.

Desejo depois que você seja útil,
Mas não insubstituível.
E que nos maus momentos,
Quando não restar mais nada,
Essa utilidade seja suficiente para manter você de pé.

Desejo ainda que você seja tolerante,
Não com os que erram pouco, porque isso é fácil,
Mas com os que erram muito e irremediavelmente,
E que fazendo bom uso dessa tolerância,
Você sirva de exemplo aos outros.

Desejo que você, sendo jovem,
Não amadureça depressa demais,
E que sendo maduro, não insista em rejuvenescer
E que sendo velho, não se dedique ao desespero.
Porque cada idade tem o seu prazer e a sua dor e
É preciso deixar que eles escorram por entre nós.

Desejo por sinal que você seja triste,
Não o ano todo, mas apenas um dia.
Mas que nesse dia descubra
Que o riso diário é bom,
O riso habitual é insosso e o riso constante é insano.

Desejo que você descubra ,
Com o máximo de urgência,
Acima e a respeito de tudo, que existem oprimidos,
Injustiçados e infelizes, e que estão à sua volta.

Desejo ainda que você afague um gato,
Alimente um cuco e ouça o joão-de-barro
Erguer triunfante o seu canto matinal
Porque, assim, você se sentirá bem por nada.

Desejo também que você plante uma semente,
Por mais minúscula que seja,
E acompanhe o seu crescimento,
Para que você saiba de quantas
Muitas vidas é feita uma árvore.

Desejo, outrossim, que você tenha dinheiro,
Porque é preciso ser prático.
E que pelo menos uma vez por ano
Coloque um pouco dele
Na sua frente e diga "Isso é meu",
Só para que fique bem claro quem é o dono de quem.

Desejo também que nenhum de seus afetos morra,
Por ele e por você,
Mas que se morrer, você possa chorar
Sem se lamentar e sofrer sem se culpar.

Desejo por fim que você sendo homem,
Tenha uma boa mulher,
E que sendo mulher,
Tenha um bom homem
E que se amem hoje, amanhã e nos dias seguintes,
E quando estiverem exaustos e sorridentes,
Ainda haja amor para recomeçar.

E se tudo isso acontecer,
Não tenho mais nada a te desejar.


Victor Hugo

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Librianos,filhos da primavera,arautos do amor.

"Love is touch, touch is love
Love is reaching, reaching love
Love is asking to be loved

Love is you...
You and me
Love is knowing
we can be

Love is free, free is love
Love is living, living love
Love is needing to be loved"   Lennon

*em homenagem a todos librianos,filhos da primavera,arautos do amor.
 
                                                           Jonh and Yoko

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

UM OUTRO POEMA DE AMOR



No fundo, as relações entre mim e ti
cabem na palma da mão:
onde o teu corpo se esconde e
de onde,
quando sopro por entre os dedos,
foge como fumo
um pequeno pássaro,
ou um simples segredo
que guardávamos para a noite. 
NUNO JÚDICE, in O MOVIMENTO DO MUNDO, ( Quetzal, 1997)


As palavras de Sophia

Pois a poesia é a minha explicação com o universo, a minha convivência com as coisas, a minha participação no real, o meu encontro com as vozes e as imagens (...) É esta relação com o universo que define o poema como poema, como obra de criação poética. (...) Se um poeta diz “obscuro”, “amplo”, “barco”, “pedra”, é porque estas palavras nomeiam a sua visão do mundo, a sua ligação com a coisa. Não foram as palavras escolhidas esteticamente pela sua beleza, foram escolhidas pela sua necessidade, pelo seu poder poético de estabelecer uma aliança (...) E no quadro sensível do poema vejo por onde vou, reconheço o meu caminho, o meu reino, a minha vida.
In Arte Poética – II

Sophia de Mello Breyner Andresen

 

 

 

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Da tristeza,esperança;da vida um passo de dança.

Danço com as palavras, com as mãos, com os olhos
Danço sozinha no meio das gentes
Danço nua, vestida de azul, ou de negro e até de vermelho já me cobri.
Danço a rir e a chorar
Danço a sonhar
Até quando amo, eu danço.

Vivi sempre a dançar, mesmo parada no meu canto
Dançarei sempre, mesmo que a música se cale
Ensaiei passos diferentes para acordes vários
Em alguns, tropecei, até caí
Mas sempre a dançar, nunca desisti
E retomava os passos novos que aprendi
Porque a dança é vida e quando eu parar
É porque morri!

Se é para ti que eu danço?
Danço para mim!
Mas esta noite, sim, a minha dança foi para ti!

(Poema de MT in Vivências)
 
 

GUARDAR

O ato poético de Antonio Cícero no poema "Guardar"
Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.
Em cofre não se guarda coisa alguma.
Em cofre perde-se a coisa à vista.
Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por
admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.
Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por
ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela,
isto é, estar por ela ou ser por ela.
Por isso, melhor se guarda o vôo de um pássaro
Do que de um pássaro sem vôos.
Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica,
por isso se declara e declama um poema:
Para guardá-lo.
 
 
 
 

Quem sou eu

E eis que depois de uma tarde de "quem sou eu"
e de acordar à uma hora da madrugada
ainda em desespero
- eis que às três horas da madrugada acordei
e encontrei-me.
Fui ao encontro de mim.
Calma, alegre, plenitude sem fulminação.
Simplesmente eu sou eu.
E você é você.
É vasto, vai durar.
O que te escrevo é um "isto".
Não vai parar: continua.
Olha para mim e me ama.
Não: tu olhas para ti e te amas.
É o que está certo.
O que te escrevo continua
e estou enfeitiçada.

(Clarice Lispector)
 
 
 

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Amor e Abismos






Sem garantias, fator de risco. Sempre. Assim é o Amor. Mergulhar ladeira abaixo e subir aos céus. Vertigem da verticalidade (não é um pleonasmo, mas uma hipérbole), de profundis e ascenção, sem precedentes. Via de regra, não há escapatória. Não se vislumbra o fundo, onde dará o azul do céu? Não sei, você não sabe. Nietzsche atentou para a necessidade de asas quando se ama o abismo. Olhe longamente para o Amor e ele olhará para você. Entregue-se. Arrisque. Absurde-se.  Acredite. 

É o que nos diz O Louco, tonto de amor. Ah, tá, isso aí é paixão, não é amor. Por gentileza deixemos de lado frases prontas, aquilo que se repete por reflexo condicionado. Não há garantias sobre sentimentos, nunca. 

Há vertigens horizontais e paradoxos. O Amor é um velho moço. Um moço velho. Uma falha constante na Matrix, um lance de dados, match point. Acontece. Aconteceu comigo com você e com o vizinho. E é único. Muitas vezes único. Várias tampas para panelas variadas ou desvairadas. Com a miragem da flor azul no fundo à superfície d' água.

Inevitável que se pense no abismo como um espelho já que ele olha para você. Experimente gritar e ele lhe responderá: Eco! Eco!  Ergo sum. Logo creio que existo quando me vejo em você. Quando não me vejo ou não gosto da imagem, passo batom, mudo a cor dos cabelos, refaço os rastros e o retrato. Caminho pelas planícies lembrando das montanhas até que me acostumo ao horizonte. Ah, que beleza há na superficialidade! 

Aprender a superfície. Dissipar neblinas. Alimentar-se do sol cru do inverno. Caminhar lentamente pelos prados noturnos com a lanterna acesa, pirilampos portáteis. O moço velho. O velho moço. Livre do Amor. Livre de Si.

Tão inevitável como o Amor é caminhar do 0 ao 9.


Zoe de Camaris

http://zoedecamaris.blogspot.com/2011/07/amor-e-abismos.html





quinta-feira, 22 de setembro de 2011

utopia

"Ela está no horizonte.
Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos.
Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos adiante.
Por mais que eu caminhe, nunca a alcançarei.
Para que serve a utopia?
Serve para isso: para caminhar."

(Eduardo Galeano)



terça-feira, 6 de setembro de 2011

Soneto XLVII

"Entre minha vista e meu coração estabeleceu-se um acordo,
E agora cada qual faz ao outro um favor:
Quando meu olho está faminto por um olhar,
Ou o coração almejando amar com suspiros que ele mesmo abafa,
Com o retrato do meu amor então a minha visão entra em festa,
E ao banquete esboçado convida o coração:
Assim, quer seja por teu retrato ou por meu amor,
Estás, mesmo longe, presente sempre ainda comigo:
Pois não estás mais distante que o alcance dos meus pensamentos,
E eu estou unido a eles, e eles contigo;
Ou se eles dormem, teu retrato na minha vista
Des
o meu coração para a alegria de vista e coração."


William Shakespeare


Cantada

Você é mais bonita que uma bola prateada
de papel de cigarro
Você é mais bonita que uma poça dágua
límpida
num lugar escondido
Você é mais bonita que uma zebra
que um filhote de onça
que um Boeing 707 em pleno ar
Você é mais bonita que um jardim florido
em frente ao mar em Ipanema
Você é mais bonita que uma refinaria da Petrobrás
de noite
mais bonita que Ursula Andress
que o Palácio da Alvorada
mais bonita que a alvorada
que o mar azul-safira
da República Dominicana
Olha,
você é tão bonita quanto o Rio de Janeiro
em maio
e quase tão bonita
quanto a Revolução Cubana

   Ferreira  Gullar




CAMINHOS DO CORAÇÃO

..."E aprendi que se depende sempre
De tanta, muita, diferente gente
Toda pessoa sempre é as marcas
Das lições diárias de outras tantas pessoas

E é tão bonito quando a gente entende
Que a gente é tanta gente onde quer que a gente vá
E é tão bonito quando a gente sente
Que nunca está sozinho por mais que pense estar

É tão bonito quando a gente pisa firme
Nessas linhas que estão nas palmas de nossas mãos
É tão bonito quando a gente vai à vida
Nos caminhos onde bate, bem mais forte o coração"

#Gonzaguinha


 AGRADEÇO A  MINHA QUERIDA LETÍCIA ABBUD,QUE ME ENVIOU ESSA LINDA LETRA!


sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Coragem, às vezes, é desapego.

“Coragem, às vezes, é desapego.

É parar de se esticar, em vão, para trazer a linha de volta.

É permitir que voe sem que nos leve junto.

É aceitar que a esperança há muito se desprendeu do sonho.

É aceitar doer inteiro até florir de novo.

É abençoar o amor, aquele lá, que a gente não alcança mais.”

-Ana Jácomo-
 
 
 
 
 
 

JUÍZO FINAL DO AMOR

O quanto te amo,
tu mesma não poderás saber,
nem eu mesmo,
pois estamos sujeitos ao tempo.

O quanto te amo,
não posso te provar em atos loucos,
na demonstração da grande ternura
e em múltiplos e ardentes poemas.

O quanto te amo
só poderá transparecer no último dia,
quando nós dois nos sentarmos à direita de Deus.

(Murilo Mendes)
 
 
 
 
 

Filho do vento

Venho de longe!
Trago nas mãos
Rosas das estações
Molhadas pela neblina do tempo
Converti em canções a minha dor
Imortalizei a saudade na poesia
Dentro do real,

Fotografei o imaginário
Com passos incertos
Caminhei sobre montanhas
Floridas de fantasias
E na magia
Recriei paisagens
Tempestades e calmarias!
 
 

Primavera

Há uma primavera em cada vida:
é preciso cantá-la assim florida,
pois se Deus nos deu voz,
foi para cantar!
E se um dia hei-de ser pó,
cinza e nada que seja a minha noite uma alvorada,
que me saiba perder...para me encontrar....

[Florbela Espanca]
- Vem ao jardim na primavera, disseste.
- Aqui estão todas as belezas, o vinho e a luz.
Que posso fazer com tudo isso sem ti?
E, se estás aqui, para que preciso disso?

Rumi (1207–1273)
 

sábado, 27 de agosto de 2011

Poema do Menino Jesus - Fernando Pessoa

O POEMA DO MENINO JESUS, DE FERNANDO PESSOA - CODIFICADO COMO ALBERTO CAEIRO 

Num meio-dia de fim de primavera
Eu tive um sonho como uma fotografia

Eu vi Jesus Cristo voltar à terra.

Veio pela encosta de um monte.

E era a eterna criança, o Deus que faltava.

Tornando-se outra vez menino,

A correr e a rolar pela relva

E a arrancar flores para deitar fora.

E a rir de modo a ouvir-se de longe.

Tinha fugido do céu.

Era nosso demais para fingir desegunda pessoa da Trindade.

Um dia, que Deus estava dormindo

e que o Espírito Santo andava a voar

Ele foi até a caixa dos milagres e roubou três.

Com o primeiro, ele fez com que ninguém soubesse que ele tinha fugido.

Com o segundo, ele criou-se eternamente humano e menino.

E com o terceiro ele criou um Cristo
e o deixou pregado numa cruz que serve de modelo às outras.

Depois ele fugiu para o sol

e desceu pelo primeiro raio que apanhou.

Hoje ele vive comigo na minha aldeia

e mora na minha casa em meio ao outeiro.

É uma criança bonita, de riso e natural.

Atira pedra aos burros.

Rouba a fruta dos pomares.

E foge a chorar e a gritar com os cães.

Nem sequer o deixaram ter pai e mãe

como as outras crianças.

Seu pai eram duas pessoas: um velho carpinteiro

e uma pomba estúpida, a única pomba feia do mundo.

E sua mãe não tinha amado antes de o ter.

Não era mulher, era uma mala
em que ele tinha vindo do céu.

E queriam que justamente ele pregasse o amor e a justiça.

Ele é apenas humano,

limpa o nariz com o braço direito,

chapina as possas d'água;
colhe as flores, gosta delas,

esquece-as.

E porque sabe que elas não gostam
e que toda a gente acha graça,

ele corre atrás das raparigas
que carregam as bilhas na cabeça e levanta-lhes as sáias.

A mim, ele me ensinou tudo.

Ensinou-me a olhar para as coisas.

Aponta-me todas as belezas que há nas flores.

E mostra-me como as pedras são engraçadas

quando a gente as tem nas mãos e olha devagar para elas.

Ensinou-me a gostar dos reis e dos que não são reis.

E tem pena de ouvir falar das guerras e dos comércios.

Diz-me muito mal de Deus.

Diz que ele é um velho estúpido e doente.

Sempre a escarrar no chão e a dizer indecências.

E que a Virgem Maria leva as tardes da eternidade a fazer meias.

E o Espírito Santo coça-se com o bico;

empoleira nas cadeiras e suja-as.

Tudo no céu é tão estúpido como nas Igrejas.

Diz-me que Deus não percebe nada das coisas
que criou - do que duvido.

"Ele diz por exemplo que os seres cantam sua glória.

Mas os seres não cantam nada
se cantassem, seriam cantores.

Eles apenas existem e por isso são seres..."

Ele é o humano que é o natural.

Ele é o divino que sorri e que brinca.

E é por isso que eu sei com toda certeza que ele é o Menino Jesus verdadeiro.

E depois, cansado de dizer mal de Deus

ele adormece nos meus braços.

E eu o levo ao colo para minha casa.

Damo-nos tão bem na companhia de tudo

que nunca pensamos um no outro.

Mas vivemos juntos os dois

com um acordo íntimo,

como a mã0 direita e a esquerda.

Ao anoitecer, nós brincamos nas cinco pedrinhas do degrau da porta de casa.

Graves, como convêm a um deus e a um poeta.

É como se cada pedra fosse um universo

e fosse por isso um grande perigo deixá-la cair no chão.

Depois ele adormece.

E eu o deito na minha cama despindo-o lentamente

seguindo um ritual muito limpo, humano e materno até ele ficar nu.

E ele dorme dentro da minha alma.

Às vezes ele acorda de noite e brinca com os meus sonhos.

Vira uns de perna para o ar.

Põe uns encima dos outros.

E bate palmas sozinho sorrindo para o meu sono.

Quando eu morrer, filhinho, seja eu a criança, o mais pequeno.

Pega-me tu ao colo.

E leva-me para dentro da tua casa.

E deita-me na tua cama.

E conta-me histórias, caso eu acorde, para eu tornar a adormecer.

E dá-me os sonhos teus para eu brincar...


(Alberto Caeiro)

 

terça-feira, 23 de agosto de 2011

A beleza de DEUS

" Rezam meus olhos quando contemplo a beleza.
A beleza é a sombra de Deus no mundo."

(Helena Kolody)




" Se desejas que Deus te seja agradável,
Olha então para Ele com os olhos daqueles que O amam.
Não olhes para essa beleza com teus próprios olhos,
Olha para esse objeto de desejo com os olhos dos Seus devotos;
Fecha os próprios olhos para não contemplarem esse doce objeto,
E toma emprestado os olhos de Seus admiradores;
Mais ainda, toma emprestado d'ele os olhos e a visão,
E com esses olhos, olha para Sua face,
Para que não fiques desapontado com a visão.
Deus diz : " Quanto àquele que é de Deus, Deus também é dele ".
Deus diz: " Sou seu olho, sua mão, seu coração "... ( Rumi - Masnavi ).



quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Não acordem o poeta!

O poeta pode ficar horas olhando a chuva que cai
Para depois admirar as gotas que ficam nas flores...
Pode não perceber que o sinal já está verde,
Pois se esquece do tempo, observando o movimento.
Ah... O poeta... Fica pensando no nada, mas em tudo,
Enquanto os versos fervilham na sua cabeça, fica mudo...
Quem vê esse processo de sono profundo, não entende
Que ali dentro dele, mora tanta coisa, até o mundo.
E dizem: “acorda!”, “por onde andam os seus pensamentos?”
...Se soubessem por onde andam, ficariam cansados,
Nunca mais reclamariam do marasmo, da lentidão,
Pois, não conseguiriam acompanhar os seus passos.
Os seus versos percorrem os caminhos áridos,
As pessoas que cruzam as ruas movimentadas,
O céu, as estrelas, a casa abandonada e a vida...
Seus poemas atravessam o tempo e o espaço.
Ah... O poeta... Ele vê os olhos brilhantes dos enamorados,
Vê o sorriso triste do palhaço, que se esconde no vermelho,
Vê a planta que brota, o pássaro que se exibe no céu
E as injustiças do mundo, até as que ninguém vê.
Então, “por favor”, não critique o poeta, não o acorde,
Ele não pode olhar a vida sem senti-la, ele respira isso,
Não o chame de lento, de desatento, de desligado...
Ele nunca desliga, está sempre ligado nos seus versos!
(Postado por Maria Cristina Gama)


segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Coisas de gaveta

Santinho de primeira comunhão,
retrato amarelado de um amigo esquecido,
recorte de jornal, esfarelado,
um poema qualquer, envelhecido.
Uma oração.
A receita de bolo, nunca feita.
O projeto de viagem, arquivado.
O botão desconjugado, perdido.
O desenho de um vestido ultrapassado.
Lá no fundo,
uma imagem de saudade antiga
no sorriso aberto de meus pais.
Um cachinho aloirado, uma chupeta.
Gaveta: histórias de amor de nunca mais.

Flora Figueiredo


quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Desapego

"Há um tempo em que é preciso
abandonar as roupas usadas,
que já tem a forma do nosso corpo,
e esquecer os nossos caminhos,
que nos levam
sempre aos mesmos lugares.
É o tempo da travessia:
e, se não ousarmos fazê-la,
teremos ficado, para sempre,
à margem de nós mesmos."
(Fernando Pessoa)







O teu riso

Tira-me o pão, se quiseres,
tira-me o ar, mas não
me tires o teu riso.

Não me tires a rosa,
a lança que desfolhas,
a água que de súbito
brota da tua alegria,
a repentina onda
de prata que em ti nasce.

A minha luta é dura e regresso
com os olhos cansados
às vezes por ver
que a terra não muda,
mas ao entrar teu riso
sobe ao céu a procurar-me
e abre-me todas
as portas da vida.

Meu amor, nos momentos
mais escuros solta
o teu riso e se de súbito
vires que o meu sangue mancha
as pedras da rua,
ri, porque o teu riso
será para as minhas mãos
como uma espada fresca.

À beira do mar, no outono,
teu riso deve erguer
sua cascata de espuma,
e na primavera, amor,
quero teu riso como
a flor que esperava,
a flor azul, a rosa
da minha pátria sonora.

Ri-te da noite,
do dia, da lua,
ri-te das ruas
tortas da ilha,
ri-te deste grosseiro
rapaz que te ama,
mas quando abro
os olhos e os fecho,
quando meus passos vão,
quando voltam meus passos,
nega-me o pão, o ar,
a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morreria.

Pablo Neruda



Nua e crua

Gosto de pessoas com sorrisos largos sem travas no maxilar;
pessoas transparentes que demonstram o que sentem.
Gosto da franqueza mesmo que seja bruta;
pode incomodar mas não machuca.
Gosto de pessoas com suavidade nas palavras.
Gosto de pessoas “gente”.
que não simulam nem barganham.
Sinto muito...
não consigo gostar da arbitrariedade!
eu só sei gostar de pessoas que
em lugar do ego ocupe um coração.

(Lúcia Gönczy) 



Só pra dizer "eu te amo"

Atravessaria mares, geleiras e montanhas,para estar ao seu lado. Iria até o infinito e chamaria pelo teu nome, até te encontrar. Só prá dizer: Eu te amo 
Sérgio Poeta



O meu amor é tanto, tanto...


Eu te amo tanto,
tanto, mais tanto,
que por vezes é canto,
que como brisa,
faz-se encanto...

Te amo ao ponto,
que és meu santo
e meu grande amor.
Motivo do meu pranto
e razão da minha dor.

E por noites a fio,
sou ternura que te espera,
doce para os teus lábios...
Sou quimera!

E diante desse amor,
que só cresce,
vivo eu tecendo prece,
para que fique ao meu lado.

É que , eu te amo tanto,
tanto e tanto...
Que para mim não seria
nenhum espanto,
morrer de amor.

ValquiriaCordeiro





 

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Flores para Coimbra



Que mil flores desabrochem. Que mil flores
(outras nenhumas) onde amores fenecem
que mil flores floresçam onde só dores
florescem.


Que mil flores desabrochem. Que mil espadas
(outras nenhumas não)
onde mil flores com espadas são cortadas
que mil espadas floresçam em cada mão.


Que mil espadas floresçam
onde só penas são.
Antes que amores feneçam
que mil flores desabrochem.
E outras nenhumas não.

Manuel Alegre

quinta-feira, 28 de julho de 2011

A filosofia do amor

Percy Bysshe Shelley (Tradução José Lino)
I
As fontes mesclam-se com o rio
E os rios com o Mar,
Ventos do Céu em mútuo rodopio
Em doce emocionar;
Nada no mundo é singular;
Tudo, da lei divina sob abrigo,
Num espírito se acha no mesclar,
Por que não eu contigo? —
II
Mirem as montanhas a beijar o Céu
E as ondas a se abraçar;
Qualquer flor-irmão estaria ao léu
Se seu irmão fosse desprezar;
e a luz do sol vem a terra abraçar
E os raios de luar osculam o mar:
De que vale esse puro laborar
Se você não me beijar?

terça-feira, 26 de julho de 2011

A dança

"Não há música.
Só o barulho do vento,
e das folhas que caem.
Mesmo assim sinto vontade de dançar.
.
É que meu olhar exagera o amor,
e pensar em você acende em mim uma esperança.
É como traçar um caminho,
que a gente sabe que nos leva de volta prá casa.
.
Agora eu sei que a minha solidão protege a sua,
como um sorriso que não está lá.
É por isso que sinto um desejo bom,
e uma vontade louca de que isso baste prá você também,
e quem sabe te ponha a dançar..."

Solange Maia

domingo, 24 de julho de 2011

A tribo do bem


Há gente que,
em vez de destruir,
constrói;
em lugar de invejar,
presenteia;
em vez de envenenar,
embeleza;
em lugar de dilacerar,
reúne e agrega.

(Lya Luft)




A sabedoria dos pássaros


"Mais sábios que os homens
são os pássaros.
Enfrentam as tempestades
noturnas, tombam
de seus ninhos, sofrem
perdas, dilaceram suas histórias.
Pela manhã, têm todos os motivos
para se entristecerem
e reclamarem, mas cantam
agradecendo a Deus por mais um dia.''


Bom dia...Vida!

Uma manhã novinha acaba de nascer...
O céu,ainda bordado de estrelas sonolentas
escondidas pelo véu das nuvens de algodão...
O sol nossa estrela amada saúda a vida e o dia
E o faz fervilhante de beleza e agitação.
Esta ciranda Divina e perfeita que acalenta
E vem encher de graça e esperança cada coração.
Celebre o novo dia com alegria e destemor,
Desaprendendo a tristeza e a nostalgia.
A vida é bela,ainda que incerta e mal fadada...
Existe um céu de muitas luzes acima de sua cabeça
A derramar efluvios celestes em sua direção.
Basta aceitar este presente doado com amor
E ter olhos de criança deslumbrada.
-Hlena Frontini-

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Serena

Com um copo com embutidos de lazúli
espera por ela

Sobre o lago em volta da tarde e o perfume de flores
espera por ela

Com a paciência do cavalo pronto para descer a montanha
espera por ela

Com o bom gosto do príncipe magnífico
espera por ela

Com sete almofadas cheias de nuvens leves
espera por ela

Com o fogo do incenso mulher enchendo o lugar
espera por ela

Com o cheiro do sândalo homem em redor do dorso dos cavalos
espera por ela

E não tenhas pressa, e se ela chegar depois da hora
então espera por ela

E se ela chegar antes da hora
então espera por ela

E não assustes os pássaros que estão nas suas tranças
e espera por ela

Para que ela se sente descansada como um jardim no cimo da sua beleza
e espera por ela

Para que respire este ar estranho no seu coração
e espera por ela

Para que levante o vestido das suas coxas, nuvem por nuvem
e espera por ela

E trá-la à varanda para ver uma lua afogada em leite
espera por ela

E oferece-lhe água antes do vinho, e não
olhes para as perdizes gémeas a dormir sobre o seu peito
e espera por ela

E toca-lhe a mão devagarinho quando
pousa o copo sobre o mármore
como se lhe levasses orvalho
e espera por ela

Fala com ela como uma flauta
com a corda assustada de um violino
como se fôsseis os dois testemunhas do que o amanhã vos prepara
e espera por ela

Ilumina-lhe a noite anel por anel
e espera por ela
até que a noite te diga:
não ficaram senão vós dois no mundo

Portanto leva-a com cuidado para a tua morte desejada
e espera por ela

Mahmûd Darwîsh

domingo, 2 de janeiro de 2011

Gaia

Gaia

Uma fenda, um espaço no tempo que crio. Um jardim, uma fonte onde ninfas, náiades, sátiros e pãs dançam ao som de címbalos e flautas encantadas. Envolvo-me em em trajes flutuantes num circulo excitante, lascivo e tentador. Sinto o vento... suave, quente como um hálito a deslizar na pele maliciosa, enquanto lábios me procuram o corpo com toques de seda, e me confundo nas sombras. Sinto os movimentos, as vibrações e penso em profecias de amor eterno e penso no tempo a virar páginas rápido demais. Envolvo-me feito dança. Rodopios de valsas... E voo nas asas dos sonhos escorregando para dentro dos espelhos onde me enrosco em gestos, braços pernas e pelos, sentindo véus e mãos, ousando truques e uma insaciável luxuria. Uma fogueira de astros resplandecentes onde brilham todos os sóis, estranhos planetas, outros sistemas e durmo... E acordo sorrindo esticando os braços, revirando na cama fazendo graça, cheirando prazer, narciso, tulipas, miosótis, violetas...

Mara Araújo


A pulsar, a pulsar...

A pulsar, a pulsar...

Dançarei diante minha morte aos olhos do sol e de todos os elementos. Da terra para a terra, do pó para o pó. Falarei de todas as batalhas perdidas, das perplexidades e das frustrações, enquanto um vento brando varrerá ...com cuidado todas as dores.
Dançarei diante da minha morte como chama, faíscas brilhantes de um fogo que refletirá nas águas dos rios que purificarão a minha alma, que se libertará.
Dançarei diante da minha morte uma última vez diante de uma lua branca de paz, e cantarei vitorias, alegrias e sorrisos. Meus amores não mais me pertencerão. Bailarão diáfanos em véus de todas as cores e voarão como chama eterna na imortalidade das grandes paixões.. E será meu coração no universo, a pulsar... A pulsar...

Mara Araújo
 
 

Eu ouço as canções que vem do mar

Eu ouço as canções que vem do mar

Lápis-lazúli. Cavalos com olhos de fogo troteiam rasgando mares e planetas, o universo, estrelas e formas. Tropéis cascos e fúria cortando túneis e vagas... Grandes vazios, todas as marcas de mãos, fendas ca...vernas e fantasmas de tantas embarcações. Sulcos cavados, rochas de vulcão, corais. Vento de mar bravio atravessando cometas, abismos, precipícios e limites. Tropéis e agua de mar salgado. Sede e frio afugentando espíritos e toda a ideologia, todos os dragões mitos e lendas. Eu ouço as canções que vem do mar. Azul-furtado. Cavalos alados. Agua viva, madrepérola, continentes conchas e cristais onde uma lua branca brilhante e nova abrange rompendo o medo como um facão, um clarão... Como um raio num jorro de pedras preciosas brilhantes rasgando luzes de infinitas cores, como cavalos brancos que galopam sobre o mar e suas canções. Como magia, como festa como sorriso... Sobre a imensa noite da lágrima.

Mara Araújo